quinta-feira, 10 de agosto de 2006

BULDOZER ENTREVISTA ALLAN SIEBER - parte 2




Legenda para ignorantes:

LC: Leo Corba
RB: Reinaldo Bruto
AS: Allan Sieber
LM: Lauro Montana
LI: Lima


LC: Tem umas tiras tuas que a gente nota que você muda propositadamente o estilo do traço, faz um lance mais seco, com a pena mais fina, sem textura. Tem algum critério, alguma situação, algum tema que te norteia nessas tiras?

AS: Esse negócio de variar o traço eu...eu gosto. Quando eu comecei a desenhar, eu ainda gosto muito do trabalho do Fábio Zimbres que é um cara que tem...

[Lauro interrompe para dizer que conhece a irmã do Fabio Zimbres. Isso gera um papinho paralelo na mesa que eu não vou perder tempo transcrevendo]

AS: Mas, então, o que eu tava falando do Fábio. Pô, o Fábio é meio esquizofrênico, assim, né? Uma hora ele desenha com lápis dermatográfico, outra hora ele desenha com caneta BIC, outra hora ele desenha com pincel bem tosco e tal. Eu sempre curti isso aí, essa coisa de não ficar com um estilo carimbo, assim, que é uma coisa que eu curto também, sabe? Esses caras tipo Angeli, Laerte, que tem uma coisa ali que é quase um carimbo. Os caras têm o domínio completo, assim, e fecharam o estilo muito bem e eles ficam ali dentro, transitam ali. Mas eu, pô...tipo o Millor também, que é outro cara que desenha cada vez...

[Lima interrompe para falar do estilo do Fábio Zimbres. Isso gera uma conversa paralela entre ele e Allan]

AS: Então, na real, vem dessa coisa de propositalmente não me prender, não ficar me policiando. Tipo "não, vou desenhar tudo com pincel!" ou "vou desenhar tudo com caneta!" e tal. E também é tipo...tem tira que eu desenho deitado na cama, sem saco, com a caneta que tiver na mão. Aí outras eu estou com mais saco, eu faço com pincel e tal. Não é uma coisa muito previsível.

LC: Por que você não ataca esse filão da charge política, tipo zoar Lula, Alckmin, Garotinho, essa porra toda?

AS: Cara, na verdade eu tenho assim um asco muito grande por política. Nunca votei na vida, nunca fui votar. Em 99 eu precisei tirar o meu passaporte lá e eu paguei 10 reais de multa. Idiota. Depois disso nunca mais votei [risos]. Eu nunca fui lá votar e não pretendo ir. Isso não é tipo levantar uma bandeira "não votem, votem nulo". Não, eu acho que as pessoas têm que votar e de preferência em alguém realmente decente. Mas eu não tenho estômago de acompanhar essa coisa, esses meandros da política e...e eu acho esquisito alguém se outorgar a essa missão de, tipo, "eu vou ser um vereador" ou "eu vou ser um prefeito, eu vou por ordem na sociedade!", eu acho isso uma coisa muito esquisita, uma pretensão meio bizarra. Mas, enfim, é o único jeito que se conhece de organizar a sociedade, a democracia, mas eu particularmente não voto. Faço questão de não me interarar muito em termos de notícia e tal.

RB: Dá para perceber que você pega leve em "Vida de estagiário". Existe alguma pressão da Folha para você maneirar ou isso parte de você mesmo?

AS: Não, na verdade é meio que um acordo tácito. A Folha é um jornal de circulação grande e o Folhateen é um caderno para adolescentes. Então, obviamente, você sabe que estando ali você está dentro de alguns limites, né? Não que alguém vai me falar "pô, você não pode fazer isso!", mas é um acordo tácito ali. Então você tem que maneirar, não pode fazer coisas muito escatológicas, sexualmente agressivas e tal. Mas não é uma coisa que me incomode, eu basicamente entro em outra frequência e tento transitar dentro daquela coisa ali, entendeu? Sem fazer uma coisa cuzona também, assim, tipo Miguel Paiva. Eu tento fazer a coisa mais honesta possível, dentro do que dá pra fazer.

LC: Vocês estão sempre zoando que quadrinista vive duro, caixa de papelão e não sei o quê. Mas, na real, como está o retorno dessa profissão?

AS: Cara, eu posso falar por mim. Eu, na verdade, a minha grana sai do estúdio de animação. Sai da Toscographics, lá do que a gente faz, o que a gente ganha com nossos projetos, com nossos curtas de animação, o que a gente ganha com publicidade, que a gente faz bem pouco, mas, enfim...coisa pra Globo, plim-plim e tal. É isso aí que eu ganho a minha grana. Ganho grana de quadrinho lá da Folha, da Sexy, agora Playboy e Trip. Mas, se eu não tivesse animação ia ser uma coisa meio complicada, né? Na verdade o pessoal tem um cultura de pagar muito mal, assim, quadrinhos e tal. E mesmo os próprios quadrinistas ficaram numa posição de coitadinhos assim "não, é, é só isso aí mesmo"...

RB: Aproveitando o gancho, tu tem algum projeto para desenhar aquela parada das Havaianas Cartunistas [aquelas Havaianas com desenhos de cartunistas famosos]?

AS: Não, cara. Isso aí foram os caras lá do marketing das Havaianas que escolheram, acho que é o Angeli, Adão, Caco e o...

LC: Glauco.

AS: ...Caco, Glauco e tem outro. Ah, o Gonzalez! Não me chamaram pra isso aí, mas eu adoraria fazer, tranquilo.

RB: Eu comprava [risos].

AS: Agora eles estão fazendo outro, de Carnaval e tal. O Adão me mostrou lá, sensacional.

LC: Parece que todo o humor do Brasil está concentrado no Rio de Janeiro. Vocês da "F" têm relação com a galera do Cocadaboa, do Casseta & Planeta e tal?

AS: A gente é super amigo do Wagner, que é o mentor lá do Cocadaboa, mas agora ele se mudou para São Paulo.

LC: Ah, é?

AS: Ele tá em São Paulo há, sei lá, alguns meses. A gente troca idéia e tal. O pessoal do Casseta eu conheço superficialmente, sei lá, o Reinaldo, o Hubert, o Cláudio Manoel e tal, mas não sou exatamente íntimo. Mas o Rio tem muita gente boa...tem aquela coisa do Pasquim, do Jaguar, do Nani, do Fausto Wolf e Millor, que é o gênio dos gênios. Eu gosto muito de morar no Rio, acho uma cidade muito boa pra fazer humor.

RB: No Japão existem colecionadores que compram a pele de pessoas muito tatuadas para fazer abajur e outras coisas esquisitas. Por quanto você venderia a sua [nota: o Allan tem a pele toda tatuada]?

AS: Cara, eu vendo desde que não arranquem ela comigo vivo [riso geral]. Eu posso pensar num preço. Mas no Japão eles compram qualquer coisa, eles compram calcinha usada, né? Japoneses são safados.

RB: É, já vi esses sites aí [riso geral].

LC: Se você pudesse matar ou mandar matar 5 pessoas agora, quem seriam essas pessoas e por quê?

AS: É, esse lance de matar é meio complicado, porque aí você mata a pessoa que merece morrer mas aí, sei lá, ela tem filhos. Outras pessoas sofrem [riso geral].

LM: Tá, mas vamos te livrar da culpa, então. Quem você deseja que deveria morrer?

AS: Eu mataria, sei lá, pessoas realmente hediondas, assim, que eu me irrito muito, tipo o Gugu. Pô, o Gugu é nojento [riso geral]! O Luciano Huck, aquele cara, porra [risos]...aquele cara que faz o papagaio da Ana Maria Braga.

LM: Loro José.

AS: Aquele cara ganha 50 pau pra fazer aquele papagaio, eu acho isso muito...

LM: Tinha que morrer degolado por militantes muçulmanos no Iraque.

AS: Com certeza! Com direito a vídeo e tal. Sei lá, a própria Ana Maria Braga, eu acho isso nojento. Esse pessoal da televisão, os Vjs da MTV também, meu...

RB: Já passou de 5 pessoas.

AS: Pensei que era 25!

LC: Que tipo de som você curte? Que música faz a tua cabeça?

AS: Cara, eu tô sempre, sempre, ouvindo música pra trabalhar, senão eu não consigo trabalhar. Mas eu ouço...eu sou meio esquizofrênico, eu escuto muita coisa. Basicamente jazz, gosto muito de jazz até os anos 60, aquela coisa do bebop e tal. Gosto de punk, Ramones, Dead Kennedys, essas coisas. Rap também eu ouço. Na verdade eu gosto de bastante coisa. O funk carioca eu gosto, o Mr. Catra...eu ouço muita coisa.

RB: E qual sua opinião sobre o rock nacional atual? E sobre as bandas famosas aqui de Brasília?

AS: Eu na verdade não estou interado no cenário atual, mas o que eu vejo é tudo muito horripilante, muito horrível. Essas coisas, sei lá, Detonautas, Charlie Brown Jr., umas coisas ridículas [risos]. Umas coisas bizarras, é, tipo, eu não entendo como esse pessoal consegue ganhar dinheiro fazendo esse tipo de merda, mas, enfim, tem quem compre. Agora, realmente eu não estou muito interado, assim. Eu inclusive prefiro ouvir músicos já mortos e tal. Acho músico muito irritante, muito superestimado, eu prefiro ouvir os que já morreram [risos].

LI: Ninguém tem como estragar o trabalho deles.

AS: Exatamente. Eles não vão fazer nenhuma merda, não vão te decepcionar e tal.


Continua...